Atenção nas estradas já deve ser costume na rotina do bom caminhoneiro. Mas para além dos cuidados comuns que precisam fazer parte de qualquer viagem segura, há certas situações em que a atenção deverá ser redobrada. O transporte de cargas perigosas é um desses casos: a especificidade é tanta que há uma série de vigilâncias e regulamentações de diferentes órgãos competentes a acompanhar e cumprir. Toda a seriedade envolvida no transporte de cargas perigosas exige que o caminhoneiro se informe muito bem sobre o assunto, seja para estar apto a realizá-lo, para orientar os colegas de profissão ou mesmo para saber que medidas tomar em casos de necessidade na estrada.
O que caracteriza uma carga perigosa?
Recebem a classificação de carga perigosa os produtos de origem química, biológica ou radiológica capazes de causar danos à saúde, ao meio ambiente ou à segurança pública. Até julho de 2017, a lista que se encaixava no critério era de 90 substâncias; com a Resolução 5.232/2016 da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) válida a partir desse período, houve um aumento bastante considerável dos critérios para a classificação, identificando mais de 3 mil tipos de produtos. Alguns dos principais são:
- líquidos (como álcool, gasolina ou óleo diesel) ou sólidos inflamáveis (como enxofre);
- produtos transportados a altas temperaturas;
- explosivos (como nitroglicerinas ou pólvoras);
- gases (a exemplo do gás de cozinha, cloro e amônia);
- materiais corrosivos (ácido sulfúrico e hidróxido de sódio são alguns dos mais comuns);
- substâncias tóxicas, oxidantes ou radioativas, dentre outros.
O transporte de todas as substâncias consideradas perigosas deve incluir cuidados específicos com embalagem, identificação e armazenamento, seguindo os critérios estabelecidos na mesma Resolução, bem como uma série de outros cuidados que consideram todos os riscos associados à movimentação das cargas, tanto para o próprio motorista quanto para o veículo e o ambiente à sua volta.
É preciso portar documentação específica?
Os cuidados exigidos pelos órgãos competentes envolvem também a regulamentação por meio de capacitações e documentações referentes tanto ao veículo quanto ao motorista e à carga. Primeiramente, é preciso saber que, conforme normatizado pelo Contran (Conselho Nacional do Trânsito), caminhões utilizados no transporte de cargas perigosas só poderão ser dirigidos por motoristas que comprovem por meio de certificado ou observação na CNH a capacitação específica, obtida pelo curso de Movimentação Operacional de Produtos Perigosos (MOPP), um curso de curta duração com validade de 5 anos ofertado por diferentes instituições ou Centros de Formação de Condutores (CFC) autorizados, a depender do estado – a recomendação é buscar junto ao DETRAN local a instituição credenciada para a realização do curso.
Já com relação ao veículo e à carga, há uma série de documentações exigidas, previstas nos artigos 22 e 28 da Resolução ANTT nº 3.665/11 e no capítulo 5.4 da Resolução ANTT nº 5.232/16. Entre os principais documentos obrigatórios, destacam-se o documento fiscal para o transporte, contendo as informações sobre o produto perigoso transportado (seguindo as especificações contidas na resolução 5.232); Ficha de Emergência, emitida pelo expedidor; certificados para veículos e equipamentos destinados ao transporte de produtos perigosos a granel, CTPP, CIV e CIPP; entre outros. Como a lista é grande e detalhada, o ideal é acessar diretamente as resoluções para fazer a checagem.
Vale lembrar que, além das documentações, não há uma licença/autorização específica para que a empresa realize o transporte dos produtos, exceto a inscrição no RNTRC (Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas), obrigatória para o exercício de toda atividade de natureza comercial de transporte rodoviário de cargas.
Quais são os cuidados necessários?
O grande risco associado ao transporte de cargas perigosas está na possibilidade de acidentes que ocasionem danos aos recipientes de transporte e consequentes vazamentos. Como se tratam de substâncias perigosas, a partir de um vazamento há risco de sérias ocorrências, como explosões e incêndios, que podem tomar enormes proporções em pouquíssimo tempo.
Outras ocorrências possíveis envolvem a intoxicação humana, ao inalar ou mesmo ter contato com determinadas substâncias, além das ameaças ao meio ambiente, como contaminação de solo, água ou plantações. Todos esses danos podem ocasionar prejuízos bem mais complexos e duradouros que uma simples perda financeira, o que justifica a necessidade de se obter o máximo controle em todas as etapas do transporte, desde a embalagem até o descarregamento no destino final. Veja alguns dos cuidados que envolvem a movimentação:
- Embalagem e sinalização: A ANTT indica que o acondicionamento de produtos perigosos deve ser feito em embalagens ou IBCs (os populares contêineres) suficientemente resistentes para suportar os choques e operações comuns ao transporte, com atenção especial ao fechamento, e há embalagens específicas para armazenar certas cargas perigosas. Obviamente, tão importante quanto a embalagem é a identificação das mesmas, que garante que qualquer pessoa que tenha contato àquela carga saiba que se trata de um material que exige cuidado especial. A sinalização da unidade de transporte inclui basicamente um painel de segurança e um rótulo de risco, mas há ainda outras regras e a rotulagem específica da embalagem. A regulamentação e acompanhamento desses aspectos, repletos de detalhes que devem ser seguidos a risca, é de responsabilidade do INMETRO, e todas as orientações sobre como fazer a sinalização e embalagem podem ser encontradas no site do órgão. Mais detalhes podem ser encontrados também na Resolução 5.232/16, citada anteriormente.
- Veículo: Os caminhões que fazem transporte de cargas perigosas são adaptados ao tipo de material a ser movimentado, respeitando o estado da substância e as recomendações de volume máximo, peso ou outras variáveis que influenciam a condução. As Resoluções estabelecem que o transporte deve ser realizado em veículos classificados como “de carga” ou “misto”, conforme definido pelo CTB (Código de Trânsito Brasileiro), porém, para cada tipo de material é necessário realizar o estudo das especificações para o transporte (carroceria, reboque/semirreboque etc.). Seja qual for, o veículo precisa estar equipado, necessariamente, com o kit para atendimento à emergência, seguindo a NBR 9735 da ABNT, e com todas as manutenções em dia (a documentação obrigatória atestará esse quesito).
- Motorista: Boa parte da segurança necessária para o transporte de cargas perigosas é garantida pelo próprio motorista durante o trajeto – não é à toa que há treinamento e tanta responsabilidade nesse tipo de serviço. O curso de capacitação trará as principais recomendações, informando primeiramente sobre a legislação e ainda sobre direção defensiva para veículos pesados, movimentação de produtos perigosos e prevenção e combate a incêndios.
Na estrada, é seu papel redobrar o cuidado, não fazer manobras arriscadas e jamais trafegar em situações de cansaço ou em que há risco na estrada, como chuva forte ou baixa visibilidade. Além disso, é preciso seguir ainda as Resoluções vigentes no sentido de não transportar, jamais, diferentes tipos de carga junto à carga perigosa.
No caso de qualquer acidente, a ajuda especializada deverá ser acionada o quanto antes, por meio da comunicação à Polícia Rodoviária, Bombeiros ou empresa de administração da via, mas sua capacitação o permitirá tomar algumas primeiras precauções, como manter as pessoas fora do contato com o material perigoso e, caso seja cabível e possível, neutralizar o vazamento com materiais como areia ou serragem.
Transportar cargas perigosas exige ainda mais atenção à direção defensiva e, principalmente, ao cumprimento minucioso das regulamentações, que existem justamente para tornar o transporte mais seguro e resguardar empresas e motoristas.
Mantenha-se sempre em dia com a lei! Cumpra também a obrigatoriedade do exame toxicológico. Saiba mais!